Orides Fontela, ao longo de seu trabalho, operou através de uma constante ontologização não apenas de animais, como de plantas e minerais. Mesclava-se a estes outros seres através da linguagem. "Coruja", de seu livro Rosácea (1986), talvez seja um dos exemplos mais apropriados para esta série dedicada à Zoopoética. É claro que Orides Fontela frequentemente recorria à consciência animal para falar do próprio fazer poético e de si mesma. Mas sua operação fazia-se através deste "coisismo ontológico", como Haroldo de Campos falaria de certos poemas do servo-croata Vasko Popa ou do francês Francis Ponge, e parece-nos frutífera nesta discussão. Queríamos também trazer um pássaro para a série. Na foto, uma cidadã do povo Suindara (Tyto furcata), também conhecidos no Norte do país como rasga-mortalha, e, no Sul, como coruja-de-igreja.
Coruja
Orides Fontela
Voo onde ninguém mais - vivo em luz
mínima
ouço o mínimo arfar - farejo o
sangue
e capturo
a presa
em pleno escuro
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