W. G. Sebald foi um prosador e poeta alemão, nascido em Wertach, na Bavária, a 18 de maio de 1944. Estudou literatura em língua alemã e inglesa em universidades da Alemanha e da Suíça. Em 1970, tornou-se professor de literatura na Universidade de Anglia Oriental (University of East Anglia), em Norwich, onde completou sua dissertação de doutorado sobre a obra do modernista alemão Alfred Döblin (1878 - 1956), autor de Berlin Alexanderplatz (1929).
Sua primeira publicação se deu como poeta, com o volume Nach der Natur. Ein Elementargedicht (1988). Nos ano 1990, viriam os romances e novelas que o tornariam famoso: Schwindel (Vertigem, 1990), Die Ausgewanderten (Os emigrantes, 1992), Die Ringe des Saturn (Os aneis de Saturno, 1995,) e aquele que é considerado sua obra-prima, Austerlitz (2001).
O autor morreu a 14 de dezembro de 2001, num acidente de carro na Inglaterra. Postumamente foram lançados o volume de ensaios Campo Santo (2003) e a antologia poética de poemas Über das Land und das Wasser. Ausgewählte Gedichte 1964–2001, em 2008.
A obra de Sebald foi traduzida no Brasil e está no catálogo da Companhia das Letras.
Abaixo, traduções de Victor Heringer e um comentário do tradutor. Recomendamos com entusiasmo todo o trabalho de Sebald: seu ensaísmo, sua prosa, sua poesia.
--- Ricardo Domeneck
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Um breve comentário sobre Sebald, o poeta
Victor Heringer
Aos leitores da prosa de W.G Sebald, estes poemas soarão familiares. Seus temas prediletos – as viagens e os exílios, as artes, os museus, as anedotas históricas multissignificantes, a geografia, a memória e o esquecimento – estão quase todos presentes. Há aqui, porém, uma nota que dificilmente ressoa na prosa: o amor. Não falo do afeto ou da ternura, de que se vale com frequência, sobretudo na coletânea de contos Os emigrantes. Falo de amor amor-mesmo.
Seu ritmo também é reconhecível, a ladainha cadenciada que os leitores mais assíduos acabam por relacionar ao avanço de um dos muitos trens que cruzam seus livros. Isso se dá sobretudo nos poemas tardios, da década 1990, quando os versos adquiriram um fôlego sufocante, que lembram o desespero desoxigenado das tormentas de fogo que o próprio Sebald descreve em Guerra aérea e literatura. Quanto à guerra e ao Holocausto, estão enterrados em alusões e referências, mais escondidas do que nos romances e contos. Mas estão lá.
Seu ritmo também é reconhecível, a ladainha cadenciada que os leitores mais assíduos acabam por relacionar ao avanço de um dos muitos trens que cruzam seus livros. Isso se dá sobretudo nos poemas tardios, da década 1990, quando os versos adquiriram um fôlego sufocante, que lembram o desespero desoxigenado das tormentas de fogo que o próprio Sebald descreve em Guerra aérea e literatura. Quanto à guerra e ao Holocausto, estão enterrados em alusões e referências, mais escondidas do que nos romances e contos. Mas estão lá.
Estes são poemas escolhidos ao acaso de uma das minhas próprias viagens. Raras vezes tive acesso aos originais em alemão, e quase sempre por meio dos comentários do tradutor que verteu os poemas para o inglês, Iain Galbraith (reunidos em Across the Land and the Water: Selected Poems, 1964-2001 [Random House, 2012]), a quem minhas próprias versões devem quase tudo.
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POEMAS DE W. G. SEBALD
Quão difícil é
entender a paisagem
enquanto você passa em um trem
daqui para lá
e, muda, ela
o vê desaparecer.
Salmo barroco
Após numerosas
expedições como pregador
a Paris
Genebra Esmirna e
Constantinopla
ele foi queimado na fogueira
em Moscou.
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Legado
Nossas memórias são bem parecidas
mas vivas numa salmoura
venenosa que
também acompanha os objetos
como parte deste vazio.
A consoladora mensagem
que diz que Pitágoras
costumava ouvir as estrelas
hoje mal chega até nós.
Então esperemos
que nossos filhos estejam aprendendo
a dançar no escuro.
§
Abandonado
como o ensaio de Kafka
sobre a natureza abominável
de Goethe.
Trigonometria das esferas
Em seu ano de luto
o Avô levou
o piano para o sótão
e nunca mais
trouxe de volta.
Com seu telescópio de metal
ele agora explora
a abóboda celeste.
Em seu caderno de registro
há um cometa com cauda
e a proposição categórica
de que a Lua é a obra de arte da Terra.
Por ele, também soube
do homem santo sentado
onde a noite vira dia
que ruge como um leão.
E uma vez ele disse não se esqueça
o vento norte traz
a luz da casa de Áries
para as macieiras.
§
No verão de 1836
disse o guia
Friedrich Chopin
se hospedou aqui no White
Swann Inn. Levou
nove dias num coche
de Paris até sua amada
Marie Wodzinka. Dava
recitais com frequência
para um pequeno grupo
que se reunia à noite
ao redor do piano. Os picos
das montanhas azuis da Boêmia
pelas janelas
eram mais escuros. O frio
e a umidade pesam
no peito o médico
resmunga algo sobre
princípio de tuberculose. No
começo de novembro
rompe-se o noivado
o pai dela, em Dresden,
não aceita de maneira nenhuma.
Treze anos depois
um pacote de cartas
amareladas é encontrado
na casa do falecido
pianista. Embrulhado com
fitas, trazia a inscrição: Moja
Bieda – Minha mágoa.
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