Seguimos com a série, publicando hoje um texto recente de Guilherme Gontijo Flores, incluído originalmente em seu livro l‘azur blasé (Curitiba: Kotter Editorial, 2016). Trata-se da quarta parte do poema “a vida e as opiniões do barnabé guilherme gontijo flores, servidor do estado”, no qual o cidadão do povo Homo sapiens dirige-se a um cidadão do povo Tapirus terrestris.
Do fabulário geral
A cena é de um tapir em transe
por causa de tamanhos tédios
travado no trânsito urbano
mas que apoiado no volante
te encara com cara cansada
e relata seu suburbano
affair com uma sarigueia
de família desconhecida
embora em lato sensu bela
com isso ele consegue apenas
comunicar naquele instante
o tédio que o corrói nas veias
por causa desse trafficjam
você no entanto nem concebe
o que seria um sariguê
e que diabos é tapir?
você tenta falar franzido
para então devorá-lo ali
no centro do engarrafamento
enquanto pensa que não deve
ser crime ambiental comê-lo
se todos sabem que esse ato
não passa da antropofagia
realizada nas cidades
o sangue ainda assim te delicia
.
.
.